Espelho das necessidades, não das vontades

The Social Network (para os menos cineastas, a história da criação do Facebook) captou o meu interesse por retratar não somente um génio, um rapaz da minha idade vocacionado e imerso num mundo paralelo ao de qualquer pessoa chamada "normal", mas também à dificuldade que este debatia interiormente de não afastar todas as pessoas que amava e que considerava importantes nesse percurso pela excelência. Dificuldade que nunca ultrapassou e cujo filme retrata com lealdade em luta constante. O final assustador de permanecer sozinho na sua criação, empresa multimilionária, sem uma única pessoa para chamar de amiga e para partilhar essa experiência avassaladora de autoconcretização profissional, toca o mais insensível expectador.

A realidade é que nos esforçamos arduamente por ser alguém: cancelamos planos, jantares, chicoteamos o corpo para atingirmos os nossos objectivos profissionais e, em cada final de dia, pensamos o porquê de ter sido assim. Porque queríamos ter brincado com o nosso filho e dar cambalhotas pela neve. Ou amarramo-nos ao pescoço do nosso paciente namorado e distribuirmos cachaços ao pai natal quando chegasse. Ao nosso marido a comida preferida, ao nosso gato o nosso melhor carinho, a nós mesmos aquele banho de imersão prometido... E acabamos o dia sem ninguém por perto, até o gato já se escondeu, e se o corpo tivesse voto na matéria, também estaria do outro lado da casa a chamar à cabeça asneiras bem feias.

No final, o que nos anima são expressões de alívio ao espelho de dever cumprido. Se tivéssemos chance de mudar o dia, sorriríamos nesse mesmo espelho até este ficar convencido que retiramos o melhor. Infelizmente somos feitos de obrigações e deveres e sofremos junto com eles. Ao longo da semana perguntei-me porque quando recebemos mérito profissional apenas recebemos sorrisos e abraços e não celebramos ao nosso sucesso. E a resposta é bem simples: para conseguir esse sucesso, magoamos quem deveria festejar connosco, e quando chega a nossa vez de festejar elas já não estão ali para nós, porque nós não estivemos ali para elas quando mereciam e imploraram a nossa atenção.

Quando a hora de celebrar chega, pensamos: será que compensou?


A Minha Amiga

Quando começo cada uma das mensagens desta página, confusa ainda sobre o que sairá (e se será coisa boa) presto-me a mui vis descobertas de mim própria que desconheceria se esta não existisse, ou se desta não se tratasse. Ao longo dos meses que a reformulei, mudei, arrumei e optimizei, esta página fez-me descobrir a minha própria essência... Entre estes cubos cheios de letras e números aqui em baixo, desde as citações a Meredith Grey, e as músicas que agora me fazem abrir a minha página apenas para as ouvir tocar, uma atrás de outra, seguidas, sem parar, formaram um orgulho pela página que mais me importa, entre muitas, a minha. Chamo-lhe página sem ofensa e critica, não colecciono outros nomes que lhe dariam nome como e-portefólio, blog, site. A página é pessoal, chama-se "a minha página", é minha e é a que preenchi aos poucos com um pouco de mim e dos meus. A forma como ela me acolheu tornou-se um hábito para mim. Uma forma de fugir ao mundo, ao nosso determinado modo de vida, e aos tormentos quotidianos que nos fazem viver pesadelos em pé. A minha página mostrou-me que independentemente do reconhecimento que não me darão pelas minhas tarefas, o orgulho com que a tratarei permanecerá e é admirado por quem a visita. Quem diria que a uma segunda-feira à noite estaria eu a referir-me a esta com dignidade e honra, a merecida mas tão temida. De facto, tornou-se como abrigo em tempos de dificuldades, em muito trabalho e tensão. Gosto da forma como ela me acolhe quando estou mal, como me abre as portas e me aconchega quando menos espero, e não espero. Agradeço a quem teve a ideia de a tornar académica, pois a fez uma obrigação para todos. Se assim não tivesse sido ela nunca existiria, nem nunca me poderia fazer descobrir, escrever, reflectir, pertencer. Cada pessoa nasceu com aptidão de aprender melhor de uma determinada forma, eu nasci para escrever aqui, porque a escrever aprendo o que não devo escrever, como não devo pensar, como não fazer o que não importa mais. É esta a minha parte, escrever para aprender. Admirada por muitos dos meus, esta minha página tornou-se a minha amiga. Junto com os hambúrguers da Lili, o colinho das tardes de terça, as gargalhadas dos simpsons, as minhas pantufas e a minha flecha, fez da minha vida mais e mais letras.

Mudança nas "tenções e viver" de Cláudio


Um diálogo final de "Diálogo das Compensadas" de João Aguiar
entre a Abadessa e o Cláudio